sábado, 22 de dezembro de 2007

QUIETO

Robson Brito

Naquela manhã de março, o dia parecia mais escuro. Acorda já cansado. Depois de esfregar os olhos, pega o jornal na sacada. Tira o elástico e abre o periódico. Mais uma manchete de homicídio violento. A taxa de juro mais alta. Escândalo envolvendo outras autoridades. Novos casos de estupros. Aquela rebelião ainda não acabara. No Oriente Médio, mais uma bomba produzira orfandade, viuvez e mutilação.


O barulho dos carros se avoluma e invade sua casa. Uma sensação estranha se alastra por todo o corpo. Sente um medo de doer. Começa a pensar o que será de si, dos filhos, da esposa, do trabalho. Parecia sentir-se ameaçado como se alguém lhe espreitasse.

“O que posso fazer pelo mundo? Quem sou eu? Que tolice a minha... Violência, injustiça e morte sempre existiram; não sou eu quem sozinho vai consertar o planeta”.

O barulho dos motores que vem de fora aumenta. Buzinas, freadas... Mais um dia começa. Prostra-se no sofá, aprisionado pelas manchetes.
Olha desconsolado para porta do banheiro: “Escovo os dentes ou me encosto aqui? Ponho a água para ferver ou aviso que não estou legal para trabalhar? Chamo as crianças ou deixo-as dormir? Estarão seguras indo para a escola? Nunca essa rua foi tão barulhenta. Ora, não posso fazer nada para mudar isso. Que besteira, eu é que não estou legal, hoje”.

Larga-se por completo no sofá. Teme que não será capaz de fazer nada naquele dia. Percorre a casa com um olhar desconsolado. Mas, fixa-se no carrinho do filho, jogado no canto. Lembrou-se do seu tempo de carrinho, feito de lata de óleo, quando o pai, lançando-se ao chão como um coleguinha, ajudava-o a construir o brinquedo. A presença do pai lhe confortava. O olhar paterno o fazia sentir-se possuído por uma amorosa força, extremamente superior a si. Uma saudade arrasadoramente alegre o dominava... Um sentimento de amparo começa a crescer dentro de si.

Lembra-se do que ouvira na noite anterior: “Quem não receber o reino de Deus como uma criança de maneira alguma entrará nele”.

A impressão que tinha é que era um menino. Estava entrando em um abrigo seguro e aconchegante. A sala parecia estar sendo plenamente amparada. Uma paz começa a crescer dentro de si e se avolumando até lhe dar uma intensa tranqüilidade. Era como nos bons tempos em que o velho pegava-o no colo, abraçando-o fortemente contra o seu peito forte. Sentia-se possuído por Alguém que lhe amava profundamente. Um estado de dependência foi lhe satisfazendo com uma gostosa plenitude.

Todavia, também ia percebendo fortemente que um mistério que não conseguia capturar totalmente o dominava. Não entendia tudo o que vivia, mas aquilo o tornava esperançoso: uma simplicidade de menino cuidado pelo Pai, protegido por Ele. Quieto. Queria apenas confiar n’Aquela força pessoal. Estava imensamente feliz por estar silente. Estava carregando suas baterias. Contentava-se em estar quieto e sentir-se confortavelmente amado... Depois de alguns minutos, pegou sua Bíblia da estante, pensou em cada frase do salmo 23. Abaixou a cabeça e orou por quinze minutos.

De repente, levanta-se como se saltasse para o mundo da segunda-feira disposto a correr horas sem parar; põe a água para ferver; escova os dentes; acorda os filhos, beijando-os; assobia no ouvido da esposa a música que ela preferia, ela se desperta sorrindo-lhe; ele põe rapidamente a roupa de guerra; enquanto amarra o cadarço do tênis, tem uma forte convicção de que aquele dia será mais um dia de vitória.

Robson Brito serve a AD de Maringá como Pastor Presidente

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